Por Marcelo Visintainer Lopes

Instrutor de Vela

Escola de Vela Oceano

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Escola de Vela Oceano – veleiro escola Oceano 6 – imagem Dagmar Bernardes

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Esta semana uma aluna me pediu para falar sobre enjoo e fiz um stories para introduzir o assunto. Prometi que faria uma postagem falando sobre…

O assunto veio à tona depois que ela realizou uma enquete em seu Instagram.

A pergunta era mais ou menos assim: o que estaria impedindo você de fazer um curso de vela?

A resposta que mais apareceu foi: receio de enjoar.

Confesso ter ficado surpreso, pois é muito raro alguém tocar neste assunto quando solicita informações sobre o curso.

Se você ainda não começou a velejar por receio de enjoar é melhor relaxar e ler com atenção o relato das minhas experiências com alunos e tripulantes.

Meu curso é ministrado por módulos (quatro no total e não obrigatórios).

Os três primeiros ocorrem nos limites entre a Ponte Hercílio Luz e as praias do norte da Ilha.

Quando o vento sopra de sudeste a sudoeste velejamos para dentro da baia e a ancoragem do almoço é na beira mar norte (em frente ao trapiche).

Nestas condições é praticamente impossível o aluno sentir alguma indisposição, já que as pequenas ondas formadas pelo vento são curtas e o barco não faz movimentos que causem enjoo.

Com ventos de norte a nordeste velejamos para o mar aberto, buscando um lugar bacana para a ancoragem do almoço.

Praia do Tinguá, Baia dos Golfinhos, Baia de São Miguel e a Ilha do Francês são alguns dos meus destinos favoritos.

Ali as ondas aumentam um pouco, ficam mais espaçadas, mas mesmo assim são muito tranquilas.

Não há tempo suficiente de aula para que consigamos pegar grandes ondulações e dificilmente alguém irá sentir desconforto.

Módulo 4. O mais avançado de todos…

Saímos de Santo Antônio de Lisboa às 9h da manhã e velejamos até o final da tarde. Buscamos um bom abrigo para pernoitar e no dia seguinte continuamos velejando.

Dependendo das condições do mar e do vento podemos ir a Porto Belo, dar a volta completa na Ilha de Santa Catarina ou pensar em qualquer outro destino que permita uma experiência de mar aberto.

Lá fora as coisas mudam, mas mesmo assim são raros os relatos de indisposição.

Em mar aberto, as oscilações produzidas com o movimento do barco são rapidamente percebidas pelo nosso organismo.

O labirinto e os olhos são os responsáveis pelo equilíbrio e são eles que merecem a nossa atenção.

Dentro do labirinto existem cristais de cálcio que deslizam sobre células ciliadas. Eles vão em direção à força da gravidade e fornecem imediatamente dados para o computador central.

O labirinto também é responsável por iniciar os reflexos para a estabilização do olhar quando viramos a cabeça (buscando o foco).

Os olhos atuam em parceria com o labirinto e também ajudam no equilíbrio, percebendo as relações espaciais.

A parceria entre os dois é fantástica! Ambos enviam informações para o cérebro e este dá o comando para as articulações e músculos garantirem o equilíbrio do corpo.

Como isto tudo é um sistema muito complexo, qualquer informação desencontrada poderá rapidamente provocar sintomas de enjoo.

O desencontro se dá pela diferença da informação fornecida pelos cristais e pela percepção dos olhos.

Se interrompermos uma ou outra informação o conflito desaparece e é por esta razão que devemos fechar os olhos logo ao sentir os primeiros sintomas de desconforto.

Com o passar das horas (para alguns) e dias (para outros), o labirinto vai conversando melhor com os olhos, deixando- nos mais à vontade com os movimentos do mar.

No meu caso, como passo muitos dias a bordo e poucos dias em terra, sinto um conforto natural e meu cérebro não entra em crise.

É uma sensação maravilhosa, mas nada comum, já que não fomos concebidos para viver na água. Nosso corpo foi criado para vivermos na terra e o nosso labirinto possui uma calibração natural para isto.

Como estou mais calibrado para o mar do que para a terra, quando piso em terra firme meu cérebro fica confuso. Normalmente sinto tontura, desequilíbrio e até enjoo.

Minha tripulação…

No período de ambientação ao balanço do mar faço questão de administrar todo o pessoal.

Forneço alimentação e hidratação, aqueço, medico e impeço que façam movimentos que possam piorar as coisas.

Antes do embarque…

Atitudes preventivas ajudam a preparar o organismo e por isto gosto de chamar a atenção para alguns pontos.

1. Alimentação. Muita gente acha que não deve se alimentar antes de ir para o mar, mas isto é um erro gravíssimo.

Você não precisa comer uma feijoada ou um churrasco de carne gorda, mas deverá estar muito bem alimentado antes do embarque.

Quando ficamos muito tempo sem comer, o estômago entende que está na hora de comer e libera o suco gástrico.

Se não ingerirmos nada, este suco fica em contato direto com a mucosa e pode causar o mal estar no estômago (levando ao enjoo), além da tradicional gastrite.

Sanduiches, frutas, ovos cozidos, frutas desidratadas e biscoitos costumam até suprir o começo de uma velejada, mas nada irá substituir uma boa refeição quente.

As refeições quentes e as sobremesas (sem açúcar) são interpretadas como “recompensas” pelo cérebro e a partir da sua ingestão tudo começa a fluir melhor…

A alimentação deve ser planejada e preparada com antecedência a fim de garantir o rápido atendimento nas condições de mar mais difícil. É por esta razão que os alimentos congelados fazem tanto sucesso a bordo: mesmo nas horas ruins é possível aquecer o alimento e consumi-lo com facilidade.

2. Ingestão de bebida alcoólica. Nas 24 horas que antecedem o embarque NÂO devemos ingerir álcool de maneira nenhuma. Desidratação geral e fígado trabalhando em excesso = combinação explosiva!

3.O bom descanso na véspera do embarque evita a fadiga. Fadiga é uma das principais causas do enjoo e por isto devemos ter uma boa noite de sono (pelo menos oito horas).

4. O frio é o último fator para completar a lista dos causadores de enjoo. Mantenha-se aquecido, principalmente nas extremidades do corpo (pés, cabeça, pescoço e mãos).

Agora que você já sabe tudo que deve ser evitado é só aprender a entender os sinais do corpo.

Observe qualquer coisa fora do padrão…

Vontade de ficar parado, sonolência, perda de apetite, dor de cabeça, tontura, cólica, azia, amargo na boca, sensação de mal estar no estômago, ânsia de vômito.

Comunique o comandante no primeiro desconforto, por menor que possa parecer. Logo no início é muito mais fácil de resolver a situação.

No início dos primeiros sintomas, assim como em todas as fases do desconforto eu ofereço Coca-Cola e biscoitos de água e sal. Esta dupla é infalível!

O refrigerante de coca é administrado a bordo como remédio, portanto deixe os pruridos de lado e tome logo! Rsrsrsrsrs

Velejar pode ser a melhor experiência da sua vida e o receio de enjoar não deve impedi-lo de começar!

Se mesmo depois de tudo o que eu falei você ainda se sentir inseguro, fique tranquilo… Tome uma remedinho antes de sair de casa e tudo ficará bem.

Tomar o medicamento ajuda muito, principalmente no psicológico. Este efeito pode ser mais importante do que o próprio princípio ativo.

Se você fizer uso no primeiro dia eu aconselho que do segundo dia em diante você tente não tomar nada. Perceba a adaptação do seu corpo, siga firme e confiante e só faça a ingestão se sentir que não vai aguentar.

Os medicamentos mais comuns são: Plasil, Dramin B6, Vonau e Meclin.

Tentou tudo e não adiantou?

Deite, estique o abdômen, feche os olhos e tente dormir!

Quando acordar beba mais uma coquinha e coma mais um biscoitinho salgado…

Últimas dicas:

– Evite baixar a cabeça

– Evite acessar o celular

– Evite entrar no veleiro (a não ser para deitar e fechar os olhos)

– Evite leituras de qualquer tipo

– Evite odores de combustível e fumaça

– Evite permanecer no sol e em lugares abafados

– Evite ficar por mais de uma hora sem alimentação e hidratação

– Evite alimentos ácidos e muito condimentados

Se você tiver alguma outra dica comprovada escreve aí nos comentários.

Bons ventos!

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