Escola de Vela Oceano – mergulhando nas Galápagos (eu e o Ruy Rodrigues)

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Consequências de um fio desencapado

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Por Marcelo Visintainer Lopes

Instrutor de Vela

Escola de Vela Oceano

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Outro dia combinei com um casal de alunos que deixaria meu SUP amarrado na popa deles até o final da minha aula. Eles embarcariam mais tarde e não pretendiam velejar naquele dia.

Com ventos fortes do quadrante sul eu ativo o protocolo “B” e passo a operar na base de Jurerê.

Remei até lá e ao encostar no púlpito de popa senti uma forte descarga elétrica.

Assim que retornei ao meu veleiro avisei o amigo e ele me disse que também já havia percebido, mas ainda não conhecia a causa.

No dia seguinte repeti a operação de deixar o SUP amarrado lá e a descarga foi ainda maior. Eu estava molhado e com os pés sobre o EVA da prancha.

Resolvi dar uma checada e percebi que a fuga de corrente vinha da popa (targa, bimini ou púlpito de popa).

Toquei em outros metais e não senti nada.

Disse a ele que possivelmente havia um fio desencapado tocando na parede dos tubos de uma das estruturas da popa.

Os fios dos equipamentos instalados sobre a targa (estrutura que serve de base) costumam passar por dentro dos tubos estruturais.

Normalmente é feito um furo e por ali eles seguem até o interior do veleiro.

As rebarbas internas das furações são verdadeiras navalhas e conforme o fio vai sendo puxado para sair do outro lado, vai sendo ferido.

A perda de isolamento na união de fios (emendas) também pode causar o mesmo problema ao entrar em contato com a parede do tubo.

Sugeri a ele que desconectasse a ligação da placa solar, já que era o único equipamento instalado ali.

A fuga de corrente foi interrompida assim que ele desconectou a placa solar.

Ufa!!!

O próximo passo foi localizar o ferimento do fio e depois iniciar uma avaliação do estado dos metais e anodos abaixo da linha d’água.

Descargas elétricas podem provocar sérios problemas a bordo, não só pelo choque em si, mas pela corrosão galvânica que se propaga por todo o barco.

Diversos metais acima e abaixo da linha d’água poderão ser comprometidos (rabeta, eixo do motor, hélice, eixo do leme, mastreação, púlpitos, pilastras etc).

Em 2015, uma situação idêntica ocorreu a bordo do veleiro que eu tripulava. Rumávamos para o arquipélago das Galápagos no Wind 44’ Blue Wind.

No caminho conversávamos sobre o rígido controle das autoridades em relação à entrada de espécies invasoras e fazia muito sentido darmos uma conferida no casco antes da chegada.

Logo ao chegar na ilha o barco seria inspecionado por dentro e por fora.

Verificam a validade dos alimentos, a presença de insetos e qualquer outra coisa que possa afetar o frágil sistema das ilhas.

Enquanto uma equipe vistoria o interior, mergulhadores caem na água para verificar o casco.

Procuram por algas, cracas, mariscos etc e só depois o barco é liberado para a permanência.

Algumas milhas antes da chegada iniciamos a operação de mergulho e eu mesmo cai na água…

Comecei pelo leme e fui em direção à rabeta do motor e hélice.

Me deparei com uma estranha estrutura branca grudada na rabeta.

Parecia uma bola de algodão!

Tocando com a mão naquela coisa ela se desfez como se fosse uma farinha soprada ao vento. A rabeta estava em processo de corrosão.

No dia seguinte, já apoitados no porto Baquerizo Moreno – Ilha de San Cristóbal, descemos para entender o tamanho do estrago.

Com a ajuda de um compressor de mergulho, limpamos a área e verificamos que a corrosão estava consumindo o bordo de ataque da rabeta.

O processo ocorreu em um curto espaço de tempo, já que o casco havia sido limpo antes da passagem pelo Canal do Panamá (de 10 a 15 dias antes).

Outra coisa que chamou nossa atenção foi ao desaparecimento do anodo grande do casco e também do seu parafuso de fixação. O parafuso fora perfeitamente cortado pela corrosão galvânica.

Realizamos a limpeza profunda com escova de aço e depois aplicamos uma massa epóxi (específica para cura em baixo d’água).

A massa é tão boa que não foi necessário substituir a rabeta e o mais interessante é que o veleiro finalizou a volta ao mundo com a massa epóxi no lugar.

Embora o reparo tenha resolvido o problema, a causa da corrosão ainda era desconhecida.

Dali voltei para o Brasil e acabei não presenciando o final da história da corrosão.

O barco seguiu para a Polinésia e a corrosão continuou causando prejuízos.

Como os anodos do casco foram substituídos a corrosão subiu para o convés e começou a consumir as pilastras, deixando grandes manchas de ferrugem sobre a fibra.

Demorou mais um tempo até a causa ser descoberta: o positivo do eólico foi ferido no momento da montagem do tubo que o sustenta.

Quando o problema começou sentíamos pequenas descargas elétricas ao encostar nas estruturas da popa, mas pensávamos que era apenas a eletricidade estática.

Foi baseado nesta experiência que consegui apontar rapidamente a provável causa da fuga de corrente do barco do meu aluno.

Um simples fio descascado!

Fique atento aos sinais…

Bons ventos!

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